9.16.2008

Potência, eficácia, segurança .Afinidade e atividade intrínseca dos fármacos


 
Potência e eficácia A potência refere-se à quantidade de fármaco (geralmente expressa em miligramas) de que se necessita para produzir um efeito, como aliviar a dor ou diminuir a pressão arterial. Por exemplo, se 5 miligramas do fármaco B aliviam a dor com a mesma eficácia que 10 miligramas do fármaco A, então o fármaco B é duas vezes mais potente que o fármaco A. De fato, um fármaco com maior potência não é necessariamente melhor que outro. Quando os médicos julgam as qualidades relativas dos fármacos, consideram muitos fatores, como o perfil dos efeitos secundários, a toxicidade potencial, a duração do efeito e, por conseguinte, o número de doses diárias requeridas, e também o seu custo. A eficácia refere-se à resposta terapêutica potencial máxima que um fármaco pode induzir. Por exemplo, o diurético furosemida elimina muito mais sal e água através da urina que o diurético clorotiazida. Por isso a furosemida tem maior eficácia, ou efeito terapêutico, que a clorotiazida. Tal como a potência, a eficácia é um dos factores que os médicos consideram ao seleccionar o fármaco mais apropriado para um doente concreto.

Afinidade e atividade intrínseca

A afinidade e a atividade intrínseca são duas propriedades importantes para a ação do fármaco. A afinidade é a atração mútua ou força de ligação entre um fármaco e o seu objetivo, ou seja, um receptor ou um enzima. A actividade intrínseca é uma medida da capacidade do fármaco para produzir um efeito farmacológico ao unir-se ao seu receptor. Os fármacos que ativam os receptores (agonistas) têm ambas as propriedades; devem aderir com eficácia aos seus receptores (ter uma afinidade) e o complexo fármaco-receptor deve ser capaz de desencadear uma resposta no alvo (atividade intrínseca). Pelo contrário, os fármacos que bloqueiam os receptores (antagonistas) aderem a estes eficazmente (afinidade), mas têm uma atividade intrínseca escassa ou nula; a sua função é simplesmente impedir a interação das moléculas agonistas com os seus receptores.
Seletividade da ação farmacológica 
Alguns fármacos são pouco seletivos, isto é, a sua ação dirige-se a muitos tecidos ou órgãos. Por exemplo, a atropina, um fármaco administrado para relaxar os músculos do trato gastrointestinal, também relaxa os músculos do olho e da traqueia e diminui o suor e a secreção mucosa de certas glândulas.
Outros fármacos são altamente selectivos e afectam principalmente um único órgão ou sistema. Por exemplo, a digitalina, um fármaco que se administra a indivíduos com insuficiência cardíaca, actua principalmente sobre o coração para incrementar a eficácia dos batimentos. A acção dos soníferos dirige-se a certas células nervosas do cérebro.Os fármacos anti-inflamatórios não esteróides como a aspirina e o ibuprofeno são relativamente selectivos uma vez que actuam em qualquer ponto onde haja uma inflamação.
Como sabem os fármacos onde têm de fazer efeito? A resposta está na sua interação com as células ou com substâncias como os enzimas. Receptores.
Muitos fármacos aderem às células através de receptores que se encontram na superfície destas. As células, na sua maioria, têm muitos receptores de superfície que permitem que a atividade celular seja influenciada por substâncias químicas (como fármacos ou hormonas), que estão localizadas fora da célula. A configuração de um receptor é tão específica que só lhe permite aderir a um fármaco com o qual encaixa perfeitamente (como a chave encaixa na sua fechadura).
Muitas vezes, pode explicar-se a seletividade de um fármaco pela seletividade da sua aderência aos receptores. Alguns fármacos aderem somente a um tipo de receptor e outros são como uma chave-mestra e aderem a vários tipos de receptores em todo o organismo. Os receptores não foram, seguramente, criados pela natureza para que os fármacos pudessem aderir a eles. Contudo, os fármacos aproveitam-se da função natural (fisiológica) que os receptores têm. Por exemplo, há substâncias que aderem aos mesmos receptores no cérebro; é o caso da morfina e dos analgésicos derivados, e das endorfinas (substâncias químicas naturais que alteram a percepção e as reacções sensoriais). Os fármacos chamados agonistas activam ou estimulam os receptores, provocando uma resposta que aumenta ou diminui a função celular. Por exemplo, o fármaco agonista carbacol adere aos receptores do trato respiratório denominados colinérgicos, causando a contração das células do músculo liso, o qual origina a broncoconstrição (estreitamento das vias respiratórias).Outro fármaco agonista, o albuterol, adere a outros receptores no tracto respiratório denominados adrenérgicos, causando o relaxamento das células do músculo liso e produzindo broncodilatação (dilatação das vias respiratórias). Os fármacos denominados antagonistas bloqueiam o acesso ou a ligação dos agonistas com os seus receptores. Os antagonistas utilizam-se para bloquear ou diminuir a resposta das células aos agonistas (de modo geral, neurotransmissores) que normalmente estão presentes no organismo.
É o caso do ipratropio, antagonista do receptor colinérgico, que bloqueia o efeito broncoconstritor da acetilcolina, o transmissor natural dos impulsos através dos nervos colinérgicos. O uso de agonistas e o de antagonistas são métodos diferentes, mas complementares, que se utilizam no tratamento da asma.
O albuterol, agonista do receptor andrenérgico que relaxa o músculo liso brônquico, pode ser utilizado junto com o ipratropio, antagonista do receptor colinérgico, o qual bloqueia o efeito broncoconstritor da acetilcolina. Os betabloqueadores, como o propranolol, são um grupo de antagonistas amplamente utilizados. Estes antagonistas bloqueiam ou diminuem a resposta cardiovascular que as hormonas adrenalina e noradrenalina promovem, as também denominadas hormonas do stress. Utilizam-se no tratamento da pressão arterial elevada, da angina de peito e de certas irregularidades do ritmo cardíaco. Os antagonistas são muito mais efectivos quando a concentração local de um agonista é elevada. A sua acção é semelhante ao corte do tráfego numa estrada principal. A retenção de veículos em hora de ponta, como às 5 da tarde, é maior que às 3 da madrugada. De modo semelhante, se forem administrados betabloqueadores em doses que tenham escasso efeito sobre a função cardíaca normal, estes podem proteger o coração contra os picos máximos e repentinos das hormonas do stress.
Uma correspondência perfeita Um receptor da superfície da célula apresenta uma configuração que permite que uma determinada substância química, como um fármaco, uma hormona ou um neurotransmissor, possa ligar-se a ele, dado que essa substância química apresenta uma configuração que se ajusta perfeitamente ao receptor.
Enzimas Além dos receptores próprios das células, os enzimas são também outros alvos importantes para a ação dos fármacos. Estes ajudam a transportar substâncias químicas vitais, regulam a velocidade das reacções químicas ou efectuam outras funções estruturais, reguladoras ou de transporte.
Enquanto os fármacos dirigidos aos receptores se classificam em agonistas ou antagonistas, os fármacos dirigidos aos enzimas classificam-se em inibidores ou activadores (indutores).
Por exemplo, a lovastatina é usada no tratamento dos indivíduos com valores elevados de colesterol no sangue. Este fármaco inibe o enzima HMG-CoA redutase, fundamental para produzir colesterol no organismo.A maioria das interações são reversíveis, quer sejam entre fármacos e receptores, quer entre fármacos e enzimas. Isto quer dizer que o fármaco se desprende ao cabo de certo tempo e o receptor ou o enzima recuperam o seu funcionamento normal. No entanto, uma interação pode ser irreversível se persistir o efeito do fármaco até que o organismo produza mais enzimas, como acontece com o omeprazol, um fármaco que inibe um enzima envolvido na secreção do ácido do estômago.
Fonte: Manual Merck

Um comentário:

Antonio Celso da Costa Brandão disse...

Reacções adversas aos fármacos

Um erro frequente é considerar que os efeitos farmacológicos se podem dividir claramente em dois grupos: efeitos desejados ou terapêuticos e não desejados ou secundários. Na realidade, a maioria dos fármacos produz efeitos vários. No entanto, o médico pretende que o doente experimente só um (ou alguns) deles.
Os outros efeitos podem ser classificados como não desejados. Apesar de quase toda a gente, incluindo os médicos e o pessoal de saúde, se referir ao efeito secundário, o termo reacção adversa ao fármaco é mais apropriado para os efeitos não desejados, desagradáveis, ou potencialmente nocivos.Não deve surpreender-nos o facto de as reacções adversas aos fármacos serem frequentes. Calcula-se que em alguns países cerca de 10 % das admissões nos hospitais são devidas a reações adversas aos fármacos. Entre 15 % a 30 % dos doentes hospitalizados apresentam, no mínimo, uma reacção adversa a algum fármaco. Embora muitas destas reacções sejam relativamente leves e desapareçam ao suspender-se a sua administração ou ao modificar-se a dose, outras são mais graves e de maior duração.
Tipos de reacções É possível dividir as reacções adversas aos fármacos em dois grupos principais. O primeiro compreende as reações que representam um excesso dos efeitos farmacológicos e terapêuticos que se conhecem e se esperam de um fármaco determinado. Por exemplo, um doente que está em tratamento com um fármaco para reduzir a tensão arterial elevada pode sofrer enjoos ou vertigens se esta diminuir excessivamente. Um diabético pode manifestar falta de forças, suor, náuseas e palpitações se a insulina ou o fármaco hipoglicemiante reduzir em excesso o nível do açúcar no sangue. Este tipo de reacção adversa ao fármaco, embora previsível, às vezes é inevitável. Uma reacção adversa ocorre se a dose de um fármaco for excessiva, se o doente for demasiado sensível a este, ou se outro fármaco retardar o metabolismo do primeiro, aumentando assim a sua concentração no sangue. O segundo grupo são as reacções que resultam de alguns mecanismos que ainda não se compreendem muito bem. Este tipo de reação adversa a um determinado fármaco é imprevisível até que o médico obtenha informação sobre outros doentes com reacções semelhantes. Exemplos dessas reacções adversas consistem em erupções cutâneas, icterícia (lesão do fígado), anemia, diminuição do número de glóbulos brancos, lesões do rim e lesões nervosas com possíveis alterações visuais e auditivas. No entanto, essas reações afetam só um grupo reduzido. Essas pessoas podem ser alérgicas ou hipersensíveis a um medicamento, devido a diferenças genéticas no metabolismo do fármaco ou à resposta do organismo à sua acção. Alguns efeitos secundários dos fármacos não se ajustam facilmente a nenhum dos dois grupos.
Estas reações são previsíveis e os mecanismos envolvidos são amplamente conhecidos. Por exemplo, a irritação gástrica e a hemorragia surgem, muitas vezes, se se tomar continuadamente aspirina ou outros anti-inflamatórios não esteróides, como ibuprofeno, quetoprofeno e naproxeno.
Intensidade das reacções Não existe uma escala universal para descrever ou determinar a gravidade de uma reacção adversa a um fármaco em particular; a avaliação é, em grande parte, subjectiva. Dado que a maioria dos fármacos se ingere por via oral, as queixas gastrointestinais representam uma percentagem elevada do total das reações conhecidas, tais como perda do apetite, náuseas, sensação de tensão, obstipação e diarreia.Os médicos consideram como reacções ligeiras e de pouca importância as referentes às queixas gastrointestinais, assim como as relacionadas com dores de cabeça, fadiga, dores musculares ligeiras, alterações no regime do sono e mal-estar (uma sensação generalizada de doença ou de inquietação). No entanto, essas reações são preocupantes para aqueles que as experimentam. Além disso, se o doente sente os efeitos da medicação como uma diminuição na sua qualidade de vida, é possível que não colabore com o plano terapêutico prescrito. Isso pode representar um problema importante para se atingir os objectivos do tratamento.As reações moderadas incluem as descritas como ligeiras, no caso em que o doente as considere ou sinta como claramente incómodas, dolorosas ou mesmo intoleráveis. Nessa lista figuram ainda reacções como as erupções cutâneas (especialmente se forem extensas e persistentes), as queixas visuais (especialmente em pessoas que usam lentes graduadas), o tremor muscular, a dificuldade em urinar (frequente para muitos fármacos administrados a homens em idade avançada), qualquer variação perceptível do humor ou do estado mental e algumas alterações nas componentes do sangue (como as gorduras ou os lipídos).O aparecimento de reações adversas ligeiras ou moderadas não significa necessariamente que se deva suspender um medicamento, especialmente se não se dispõe de uma alternativa melhor. No entanto, o médico deve fazer uma nova avaliação da dose, do ritmo de administração (número de doses diárias), do horário (antes ou depois das refeições, ao levantar ou ao deitar) e do uso possível de outros agentes para aliviar o doente (por exemplo, o médico pode recomendar o uso de um laxante, se o fármaco provocar obstipação).Por vezes, os fármacos provocam reações graves com risco de morte, embora estas sejam relativamente raras. As reações graves implicam que se suspenda a administração do fármaco e se proceda ao seu tratamento. No entanto, em certos casos, os médicos devem continuar a administrar fármacos a pessoas de alto risco (por exemplo, tratamentos com quimioterapia em doentes com cancro, ou fármacos imunosupressores para doentes submetidos a transplantes de órgãos). Utilizam-se então todos os meios disponíveis para tratar essas reações graves. Os médicos administram, por exemplo, antibióticos para combater a infecção em doentes com um sistema imunitário debilitado. Também é possível administrar antiácidos líquidos de alta potência ou bloqueadores dos receptores H2, como a famotidina ou a ranitidina, para prevenir ou curar úlceras gástricas. Podem igualmente efectuar-se transfusões de plaquetas para tratar hemorragias graves ou então injetar eritropoietina para estimular a produção de glóbulos vermelhos em doentes com anemia induzida por um fármaco. Testes e controlo de segurança em fármacos novos
Antes de as autoridades sanitárias autorizarem a comercialização de um fármaco novo este deve submeter-se a testes rigorosos tanto em animais como em seres humanos. A maior parte dos testes tende a avaliar a sua eficácia e a sua segurança relativa. Primeiro, efectuam-se estudos em animais para recolher informação sobre a cinética do fármaco (absorção, distribuição, metabolismo e mecanismos) e a sua segurança, incluindo possíveis efeitos sobre a capacidade de procriação e a saúde da progénie. Nesta fase do estudo são muitos os fármacos que são rejeitados por não demonstrarem efeitos positivos ou por serem demasiado tóxicos.Se os testes em animais forem satisfatórios, as autoridades sanitárias permitem que o fármaco seja estudado em seres humanos. Estes estudos efectuam-se em várias fases. Nas fases de pré-comercialização (fases I, II e III), o fármaco novo é estudado primeiro num pequeno número de voluntários sãos e depois num número crescente de pessoas que sofram ou possam contrair a doença que o fármaco, supostamente, deve poder curar ou prevenir. Além de determinar a eficácia terapêutica, os estudos em seres humanos incidem no tipo e na frequência dos efeitos secundários e nos fatores que favorecem essas reações (como a idade, o sexo, as perturbações agravantes e as interacções com outros fármacos).Em seguida, são apresentados às autoridades sanitárias os dados obtidos durante os testes nos animais e seres humanos, juntamente com uma proposta de processo de produção do fármaco, o folheto explicativo que se deve juntar ao produto, uma vez comercializado, e o texto que aparecerá no rótulo do produto.Na maior parte dos casos o procedimento de revisão e de aprovação necessita de 2 a 3 anos a partir do momento da apresentação da solicitação, mas as autoridades podem reduzir este período para um fármaco que considerem ser um avanço terapêutico de maior importância.Mesmo depois de ser aprovado o novo fármaco, o fabricante deve levar a cabo um controlo de pós-distribuição (fase IV) e comunicar, em seguida, os efeitos secundários adicionais ou não detectados durante os testes. Os médicos e os farmacêuticos são convidados a participar na verificação ou controlo do fármaco. Esse controlo é importante, porque mesmo nos estudos mais completos, anteriores à comercialização, só podem ser detectados efeitos secundários que apareçam numa proporção de uma em cada 1000 doses. Os efeitos secundários importantes que se manifestem um em cada 10000 doses, ou, ainda mais, em cada 50000 doses, só podem ser detectados quando um grande número de pessoas utiliza o fármaco, uma ves este comercializado. As autoridades sanitárias podem exigir a retirada do fármaco se novas evidências indicarem que este pode, de algum modo, ser perigoso.




Relação entre benefícios e riscos

Qualquer fármaco pode ter, ao mesmo tempo, efeitos positivos e negativos. Antes de prescrever um fármaco, os médicos avaliam os riscos e os benefícios possíveis que esperam obter. O uso de um fármaco não é justificado se os benefícios não superarem os riscos possíveis. Os médicos devem também considerar as consequências de suprimir o fármaco. Na maioria dos casos, os benefícios e os riscos potenciais não se podem determinar com precisão matemática.Quando se calculam os efeitos positivos e negativos de um fármaco, os médicos consideram a gravidade da perturbação que se está a tratar e o impacto que terá na qualidade de vida do paciente. Por exemplo, as queixas relativamente leves como a tosse e os resfriados, as distensões musculares ou as dores de cabeça ocasionais, podem aliviar-se com fármacos de venda sem prescrição médica, cujo risco de efeitos secundários é muito reduzido.Os fármacos de venda livre para o tratamento de perturbações menores apresentam uma margem de segurança ampla se forem administrados segundo as instruções. No entanto, o risco de reacções adversas aumenta se se tomarem ao mesmo tempo outros fármacos com ou sem prescrição médica. Em contrapartida, deve assumir-se um maior risco de reacções graves quando se utilizarem medicamentos para tratar uma doença grave ou potencialmente mortal (por exemplo, um enfarte cardíaco, um acidente vascular cerebral, um cancro ou a rejeição de um órgão transplantado).