5.24.2013

Beleza como efeito colateral

A indústria cosmética recorre a medicamentos destinados ao tratamento de diversas enfermidades para formular novos produtos. Este mês chega ao Brasil um creme contra rugas criado a partir de uma medicação para doença de pele

Monique Oliveira

De olho nos avanços dos laboratórios farmacêuticos, os cientistas da beleza estão tomando emprestado alguns medicamentos com ação comprovada contra doenças para reforçar seu arsenal de combate a problemas de difícil solução, como a flacidez da pele e a perda dos fios de cabelos e cílios. Neste mês, a empresa de cosméticos Avon colocará no mercado o mais novo representante dessa categoria, um creme contendo a molécula Aminofil-33. Até agora, ela era normalmente receitada para o tratamento da ictiose lamelar, doença genética rara que causa graves escamações da epiderme. De acordo com a indústria, testes realizados no seu Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Produtos, nos Estados Unidos, indicaram que essa molécula também estimularia a produção de colágeno, proteína que dá firmeza à pele. “Essa substância consegue desativar o bloqueio ao colágeno por um caminho biológico desconhecido até então”, disse à ISTOÉ o bioquímico Robert Kalafsky, diretor do Centro de Pesquisa da companhia. O novo cosmético promete ação intensa sobre rugas profundas.
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OLHAR
Pamela usa produto para estimular o crescimento dos cílios.
Seu princípio ativo é o mesmo de um medicamento contra o glaucoma
Outro produto com percurso similar é o manitol, originalmente indicado para tratamento do edema cerebral. “Ele está ganhando cada vez mais espaço entre os recursos para dar volume a àreas específicas do rosto e atenuar rugas”, diz o cirurgião plástico Vitorio Maddarena, de São Paulo. Indicado em associação com o ácido hialurônico, composto já utilizado para o preenchimento de rugas profundas, o manitol tem a propriedade de atrair em média dez vezes mais água para a região a ser tratada, o que potencializa o efeito do ácido hialurônico. Como resultado desse efeito já comprovado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovou o produto Juvéderm Hydrate, da Allergan, que combina as duas substâncias para o tratamento de rugas finas e já está sendo usado nas principais clínicas de dermatologia e cirurgia plástica do País. “São necessárias aproximadamente cinco sessões e o resultado é praticamente imediato”, explica a dermatologista Silvia Zimbres, que passou a utilizar o produto em seu consultório em São Paulo.“Antes o único tratamento para marcas superficiais era o laser, muito mais caro e agressivo.”
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Entre os remédios que serviram de base para a formulação de novos cosméticos, um em especial, o bimatoprosta, revelou seu potencial para a beleza a partir de efeitos curiosos. Usado em colírios prescritos para tratar o glaucoma (doença caracterizada pela elevação da pressão intraocular), a substância deflagrou um crescimento anormal dos cílios. Com esse resultado, a indústria não perdeu tempo. Hoje é possível encontrar no mercado o Latisse, produto recomendado para portadores da hipotricose, condição definida pela quantidade insuficiente de cílios para a proteção do globo ocular. Como não possui efeitos colaterais, há aqueles que o utilizam para dispensar os cílios postiços e realçar permanentemente o olhar. É o caso da analista de mídias sociais Pamela Nunes, 25 anos, que adotou o produto há três meses e passou a integrá-lo na sua rotina diária de beleza. “Uso sempre antes de dormir”, diz. “Fiquei impressionada porque meus cílios cresceram tanto que chegam até a encostar nos óculos”, diz.
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O sucesso com o bimatoprosta é tanto que agora o composto está sendo estudado para combater a queda de cabelo. Estudo publicado pela revista da Associação Americana de Biologia Experimental demonstrou, em ratos, que a substância ativa folículos capilares inativos, permitindo a retomada da capacidade de crescimento dos fios. Os mesmos efeitos foram obtidos com folículos capilares humanos. “O teste revelou novos caminhos de ativação de receptores para o crescimento de cabelo a serem explorados”, disse à ISTOÉ Valerie Randall, do Centro de Ciências da Pele da Universidade de Bradford, no Reino Unido, e uma das autoras do trabalho. O passo seguinte será testar o produto em seres humanos. Também está em avaliação o Dermagraft (laboratório Shire), um composto de células vivas aprovado nos Estados Unidos e no Canadá para tratar úlceras nos pés provocadas pela diabetes. Na beleza, sua função potencial é o preenchimento de sulcos e marcas de expressão.
Fotos: Pedro Dias/ Ag. Istoé

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