8.17.2013

O poder do umami, o quinto gosto fundamental

  • Além do salgado, azedo, amargo e doce, existe o umami, que tem o poder de fazer com que os pratos fiquem mais agradáveis com ingredientes naturais
Viviane Nogueira
Combinado. Cogumelos e carne são alimentos ricos em umami, gosto que começa a ser identificado antes mesmo do nascimento Foto: Divulgação
Combinado. Cogumelos e carne são alimentos ricos em umami, gosto que começa a ser identificado antes mesmo do nascimento Divulgação
Coloque um pedaço de tomate na boca, deguste lentamente. Repita a operação com um pedaço de queijo parmesão. Depois de sentir o gosto ácido e doce do tomate e o gosto salgado do parmesão, o que dá continuidade ao paladar é o umami, quinto gosto fundamental (junto com salgado, azedo, amargo e doce) descoberto no início do século XX pelo cientista japonês Kikunae Ikeda, mas só reconhecido pela comunidade mundial no ano 2000. Umami, aliás, quer dizer saboroso em japonês, uma propriedade conferida pela combinação do glutamato monossódico característico desse gosto (que também é composto pelos nucleotídeos inosinato e o guanilato) com moléculas de outros alimentos. Isso faz com que o prato fique mais saboroso, sem que haja vontade de comer mais quantidade.
— O umami pode ser usado para aumentar a palatabilidade, realçando o sabor sem aumentar a ingestão de sal (o sódio até hoje é usado para o mesmo fim). Outro aspecto que ainda necessita de mais pesquisas mas que já vem sendo estudado é a possibilidade de o umami contribuir para a sensação de saciedade — explica o neurocientista Ivan Araújo, professor da Universidade de Yale que falou esta semana, no Rio, sobre como o gosto age no cérebro no “I Simpósio Latino-americano sobre Umami”.
Estímulos associados potencializam sabor
Com os cinco gostos fundamentais a recepção no cérebro se dá da mesma maneira: há um aumento de atividade em determinadas áreas quando sistema nervoso central recebe sinais transmitidos pelos receptores na cavidade oral e identifica o que á salgado, doce, azedo, amargo ou umami. Mais especificamente as áreas do córtex gustatório primário, na ínsula, e o córtex orbital, acima dos olhos, associado à resposta a quaisquer estímulos agradáveis, não só de comida.
Esses receptores, no entanto, se encaixam melhor quando há mais de um estímulo, segundo o estudo do neurocientista. Um prato bonito, com cheiro ótimo, portanto, melhora a sensação do gosto no cérebro. Com o umami, que consegue potencializar o sabor do prato, esta interpretação do cérebro fica mais intensa.
— Isto também pode ser exemplificado quando uma foto de um alimento familiar à pessoa, que traz a lembrança de uma boa experiência, causa reações de salivação como se estivesse na boca — diz o professor Ivan Araújo, que nos EUA ensina como o cérebro controla a fome e os mecanismos de recompensa.
O umami foi percebido pela primeira vez no dashi, um caldo típico da culinária japonesa composto de alga marinha seca, peixe bonito desidratado e cogumelo shiitake seco. Carnes (principalmente maturadas), aspargos, frutos do mar, queijos e cogumelos (champignon, shiitake e shimeji) são fontes de umami.
Identificação começa no útero
Um estudo publicado este ano na revista “Current Biology” pelo Departamento de Nutrição da Universidade de Drexel, na Filadélfia, defende que a habilidade de perceber sabores começa no útero, com o início do funcionamento e desenvolvimento dos sistemas gustativo e olfativo. Como o líquido amniótico e o leite materno contêm moléculas derivadas da dieta da mãe, essa iniciação determina as preferências ao longo da vida. Logo após o nascimento, os gostos doce e umami têm respostas positivas do bebê. Amargo e azedo, têm respostas negativas.
“Essas preferências gustativas podem refletir um impulso biológico para os alimentos que são calorias — e proteínas — densas e uma aversão aos alimentos que são venenosos ou tóxicos”, explicam os autores da pesquisa.
A quantidade de glutamato no leite materno chega a 50% do total dos aminoácidos livres, que não estão presentes na estrutura das proteínas, mas estão no plasma sanguíneo ou dentro de diversas células, usados como materiais para síntese de vitaminas, hormônios e novas proteínas.
Assim como as crianças, os idosos também são sensíveis ao umami. Dois estudos japoneses já relacionaram a perda do gosto umami à falta de apetite e emagrecimento em idosos, resultando em diversos problemas de saúde. A perda de paladar foi apontada ainda como causadora da falta de salivação, problema que afeta todo o trato digestivo, já que a saliva é responsável por ajudar na mastigação e deglutição, na formação do bolo alimentar e proteção da mucosa da boca contra infecções. Com a idade avançada e o uso de medicamentos, a sensibilidade ao gosto, a secreção salivar e a mastigação ficam alteradas e o restabelecimento dessas habilidades foi conseguido pela introdução de alimentos umami no cardápio desses pacientes.
Os pesquisadores investigaram padrões de indução de saliva em adultos saudáveis depois do estímulo umami, que teve a mesma intensidade do gosto azedo, usado frequentemente em hospitais para promover salivação.
“De forma surpreendente o gosto azedo promoveu forte salivação durante um curto período, até dois minutos após o estímulo. Já o umami induziu a salivação por mais de dez minutos”, descreve o autor do estudo Hisayuki Uneyama, que acredita que testes como este podem ajudar a desenvolver novos tratamentos para distúrbios relacionados à alimentação, como boca seca, disfagia e anorexia.
No Brasil, o Comitê Umami, filiado ao Umami Information Center e formado por técnicos de diversas áreas, como engenharia de alimentos, nutrição, legislação e segurança alimentar, farmacologia, ciência dos alimentos, toxicologia e comunicação estuda e divulga o conceito umami, com receitas e informações sobre os principais alimentos e suas concentrações de glutamato no www.portalumami.com.br.

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