9.17.2013

Ginkgo biloba tem poder

Pesquisas alimentam a esperança de que a planta do Oriente previna (e ataque) tumores no ovário, na mama, no cérebro e no fígado. Com o seu extrato por perto, as células malignas se autodestroem por Duda Teixeira | design Thiago Lyra | foto Dercílio
Nome Científico: Ginkgo biloba L.
Nome popular: Nogueira-do-japão
Origem: Extremo Oriente
Aspecto: As folhas se dispõem em leque e são semelhantes ao trevo. A altura da árvore pode chegar a 40 metros. O fruto lembra uma ameixa e contém uma noz que pode ser assada e comida

A ginkgo biloba foi a primeira planta a brotar após a destruição provocada pela bomba atômica na cidade de Hiroshima, no Japão

A ginkgo já é famosa por suas façanhas. O extrato obtido de suas folhas comprovadamente reduz as tonturas, refresca a memória, alivia as dores nas pernas e nos braços e acaba com o zumbido no ouvido. Por tudo isso ela arrebanhou uma vasta clientela, composta na maior parte por idosos. Mas suspeita-se que o poder dessa planta de folhas de formato de leque vá além. Estudos realizados em laboratório e com seres humanos sugerem sua capacidade de prevenir e atacar tumores — mais um importante item que se acrescenta ao seu currículo.

Uma das pesquisas que obtiveram resultados mais estrondosos foi concluída no final do ano passado. Ao todo, 1 388 mulheres foram acompanhadas por seis meses. Todas relataram tomar algum tipo de remédio fitoterápico — equinácea, ervade- são-joão, ginseng e ginkgo. As que ingeriram esta última diariamente tiveram uma incidência 60% menor de tumores de ovário. Para entender o que estava ocorrendo, os surpresos cientistas levaram a ginkgo para dentro do laboratório. Lá misturaram o extrato da planta a culturas de células de ovário cancerosas. Bastou uma pequena dose para que o crescimento delas fosse reduzido em 80%.

ESTUDO PIONEIRO

Foi a primeira vez que se vislumbrou uma relação entre a ginkgo e o combate ao câncer de ovário. "Como o nosso estudo é pioneiro, as conclusões precisam ser confirmadas por novos trabalhos", disse à SAÚDE! Daniel Cramer, diretor de Obstetrícia e Ginecologia Epidemiológica do Brigham and Women`s Hospital, ligado à Escola Médica Harvard, nos Estados Unidos. "Até que outras investigações sejam feitas, acredito que mulheres com mais de 50 anos e histórico familiar de câncer de ovário deveriam considerar tomar ginkgo", diz ele.

Quando se fala em tumores em geral, o relatório de Cramer não é tão inovador assim. Mais de 50 estudos sobre ginkgo e câncer já foram catalogados. Em 2002 uma pesquisa conduzida pelo grego Vassilios Papadopoulos mostrou em laboratório e em testes clínicos que a ginkgo inibe o crescimento agressivo de tumores de mama. Também existem trabalhos sobre câncer cerebral e de fígado. "Essa já não é uma área de pesquisa em sua infância", diz Nise Yamaguchi, pesquisadora da USP e vice- presidente do Núcleo de Apoio ao Paciente com Câncer, em São Paulo. "Já existem muitos estudos consistentes. E com conclusões parecidas."

A maneira como a ginkgo e seus componentes agem em escala celular ainda não foi totalmente decifrada, mas há algumas hipóteses. "Talvez a planta esteja envolvida com a habilidade do organismo de causar apoptose, a morte programada de células defeituosas", diz Cramer (veja infográfico na próxima página). Outras estratégias descritas em diferentes trabalhos são sua habilidade para inibir os vasos que alimentam o câncer e sua capacidade de evitar danos ao DNA. Esses efeitos são obtidos por meio da ação de duas substâncias, os terpenóides e os bioflavonóides. Os primeiros viraram objeto de estudo mais recentemente. Os bioflavonóides, contudo, são conhecidos de longa data. Agem como antioxidantes, combatendo os radicais livres e impedindo o envelhecimento. Ambos fazem parte do mesmo extrato, o EGb 761 — matéria-prima dos comprimidos vendidos em farmácias.

O comprimido de ginkgo biloba desencadeia diversas reações que vão desde os pés até os ouvidos. Os vasos sangüíneos se dilatam e o sangue fica menos viscoso (mais "fino", como se diz). Assim, corre mais rápido, com mais facilidade, e alcança melhor os lugares mais distantes do coração. O labirinto, estrutura que pertence ao ouvido, passa a ser mais bem irrigado e oxigenado, o que ajuda a acabar com tonturas e zumbidos. As áreas do cérebro responsáveis pela memória e pelo raciocínio ficam mais despertas. O fluxo mais intenso também acaba com as dores nos braços e nas pernas, comuns na terceira idade. "A ginkgo produz muitos resultados e por isso divide com a ervade- são-joão o título de planta mais estudada na atualidade", afirma João Batista Calixto, professor de farmacologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e autoridade brasileira em medicamentos fitoterápicos.

Entre todas as benesses creditadas à planta, uma passou a ser questionada recentemente. É a que se refere à contribuição da ginkgo aos pacientes com Alzheimer. "Possivelmente o benefício seja alcançado apenas se a droga for utilizada de forma preventiva, anos antes do início da doença", diz Orestes Forlenza, psiquiatra e pesquisador do Laboratório de Neurociências da Universidade de São Paulo. "Os estudos clínicos da ginkgo para o tratamento de demências não demonstraram vantagens consistentes, possivelmente porque já era tarde demais e o tamanho do efeito era muito pequeno para modificar o curso clínico", explica o pesquisador, que fez uma revisão da literatura médica sobre o assunto.

São raros os casos de efeitos colaterais advindos da ingestão de ginkgo, mas não se pode ignorá-los. O remédio possui tarja vermelha e só pode ser vendido com receita médica (a dose máxima recomendada é de 240 mg/dia). Esse cuidado existe porque, ao dilatar os vasos sangüíneos, a ginkgo pode provocar enxaqueca e aumentar a sensibilidade da pele, causando alergias. Esse problema é maior nas cápsulas de pó macerado e nas folhas para chá, vendidas em lojas de produtos naturais. Além de ter a eficiência questionada (veja o quadro na próxima página), elas possuem grandes quantidades de um ácido capaz de irritar a pele. Ao afinar o sangue, a planta também pode causar sangramentos (antes de submeter um paciente a cirurgia, os médicos costumam pedir que cesse a ingestão do comprimido). Na bula do medicamento há ainda advertências com relação a distúrbios gastrointestinas e queda de pressão arterial. "A ginkgo é uma planta segura, mas deve ser usada com cautela", resume o americano Daniel Cramer.


MORTE PROGRAMADA
Na presença da ginkgo, as células malignas se autodestroem

1. PROCESSO NORMAL
Quando alguma célula se danifica, sofre radiação ou infecção, o organismo envia uma ordem para que ela se autodestrua. Esse processo é chamado de apoptose.

2. CÉLULAS TUMORAIS
De vez em quando surgem células malignas que podem se multiplicar desordenadamente. O corpo manda a mesma ordem de implosão, mas elas não obedecem.

3. COM GINKGO
Na presença da ginkgo, as células tumorais ficam menos "teimosas". Quando a mensagem chega, a célula pode ter a membrana rompida. Os restos são comidos por fagócitos, defensores do corpo.


ALENTO EM CHERNOBYL
Em 1986 a usina nuclear de Chernobyl, na então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, sofreu uma forte explosão de vapor seguida de incêndio. Mais de 200 mil pessoas tiveram de ser transferidas para evitar os efeitos da radiação. Um estudo publicado em 1995 ministrou extrato de ginkgo para 30 trabalhadores que estavam na área do acidente. Por dois meses eles tomaram três comprimidos de 40 mg. Ao final, a ginkgo reduziu os efeitos colaterais provocados pelas radiações excessivas e diminuiu o número de porções alteradas no DNA desses homens.

PRODUÇÃO GLOBAL

O extrato usado nos comprimidos viaja pelo mundo antes de chegar às prateleiras das farmácias. Em geral, as árvores são cultivadas na região de Bordeaux, na França, e na Carolina do Sul, nos Estados Unidos — tidas como as mais adequadas para o cultivo da planta. Depois de colhidas, as folhas são enviadas à Irlanda para serem extraídas. Em seguida a matéria-prima é exportada para vários países (o Brasil é um deles) onde os comprimidos são feitos e embalados.


DÁ PARA CONFIAR?
Nas farmácias brasileiras, os comprimidos de extrato de ginkgo vendidos só com receita médica competem com cápsulas de pó moído e folhas, em embalagens expostas nas prateleiras ao alcance do consumidor. Muita gente relata efeitos benéficos advindos dessas fórmulas alternativas. Mas seriam elas tão eficazes quanto os comprimidos? A resposta é não. Pesquisadores da UFSC fizeram testes para saber quanto tem de componentes do extrato EGb 761 nessas cápsulas e nas folhas da planta. Conclusão: para obter a mesma quantidade de um único comprimido de 120 mg seriam necessárias 20 cápsulas de 200 mg de pó moído. Quanto ao chá, a eficácia depende da qualidade da matéria-prima. "Mas seria preciso ingerir grande quantidade, já que os teores das substâncias ativas no chá caseiro são baixos", afirma Cláudia Simões, autora do trabalho e pesquisadora da UFSC. "A proporção ideal só é obtida com os extratos secos padronizados."

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