2.21.2014

Freixo, o intocável (Cidinha), O alarme (Veríssimo)

Todos os homens públicos não estão sujeitos a ter a sua conduta questionada em algum momento da vida? Mas Marcelo Freixo, enfant-gaté da esquerda caviar, não

O Dia
Rio - Era previsível a reunião de “desagravo” a Marcelo Freixo. Esquerdistas do Posto 9, humanistas do Leblon e turistas da política em geral gritaram: “Com ele não!!!”. Mas por que não? Todos os homens públicos não estão sujeitos a ter a sua conduta questionada em algum momento da vida? Mas Marcelo Freixo, enfant-gaté da esquerda caviar, não.
Ter dois advogados em seu gabinete, pagos com dinheiro público, trabalhando num instituto que defende black blocs, só seria questionável se o contratante fosse o Bolsonaro. Freixo não! Sem falar nos outros dois advogados na mesma situação exonerados recentemente.
Nepotismo, ainda que cruzado, só é feio quando praticado pelos outros. Freixo não! Sua mulher, Renata Stuart, é funcionária do vereador Renato Cinco (aquele que doou dinheiro para a Sininho), mas já passou pelo gabinete de Eliomar Coelho, todos do Psol. Imagina se fosse o Renan?
Taí um partido generoso com as esposas dos companheiros. A mulher do ex-deputado Milton Temer, Rosane Andrade de Aguiar, que recentemente passou com o marido temporada de três meses em Paris, é empregada no gabinete da liderança do Psol, onde também bate ponto (será?) Cristiane Pena Dutra, esposa do bombeiro Daciolo, aquele que colocou fogo na greve dos bombeiros.
Quando o telhado é do Psol, ninguém pode jogar pedra. O senador Randolfe Rodrigues (AP) — também presente ao “desagravo” a Freixo — foi acusado de receber um mensalinho. Ficou indignado porque saiu no jornal. Mas quando é o Zé Dirceu...
Conheço bem o Freixo. Fui vice-presidente da CPI das Milícias, junto com outros seis companheiros. Eu e minha família fomos ameaçados por Cristiano Girão, hoje preso fora do estado. A imprensa — essa mesma que hoje ele acusa de perseguição — nos ajudou e muito na investigação. Da parte dele, nenhuma palavra de agradecimento.
Estranhei a ausência da deputada Janira Rocha no “desagravo” a Freixo. Depois do escândalo em que meteu, não convinha mesmo dar as caras. No “desagravo”, também não vi manifestações de solidariedade à família de Santiago Andrade. No Facebook do deputado, tem uma declaração formal: “Sinto muito. Minha mulher trabalhou com ele.” E se fosse um policial a ter a cabeça estourada? Ele se solidarizaria? Ou policial só é legal na sua segurança pessoal?
O deputado tem um jeito muito particular de lidar com a democracia e a liberdade de imprensa. Para Marcelo Freixo, a mídia só é boa quando ele é a fonte ou a estrela.

Deputada estadual pelo PDT

O alarme

  • Muitos não acreditaram que o nazismo chegaria ao poder e depois aos seus excessos. E pagaram por não reconhecer o momento

Quem viu o filme de Stanley Kubrick “2001 — Uma odisseia no espaço” se lembra do monólito, aquela pedra lisa encontrada por um astronauta na órbita de Júpiter, que se revela estar ali há milhões de anos como uma espécie de alarme. Sua descoberta por terrenos significaria que essa raça predatória e assassina já tinha a capacidade técnica de invadir, e fatalmente envenenar, o Universo. O monólito era um aviso. Esta interpretação não fica clara no filme, mas o titulo do conto de Arthur C. Clarke no qual Kubrick e o próprio Clarke basearam seu roteiro é “O sentinela".
Haveria um momento na vida das pessoas ou das sociedades em que funcionaria um alarme parecido com o que alertou o Universo para a chegada dos temíveis humanos, no filme. Pode-se especular sobre qual seria esse momento para um judeu na Alemanha, nas primeiras manifestações do nazismo, por exemplo. Seria a pregação racista do partido mesmo antes de assumir o poder? Seria o que já se sabia do pensamento de Hitler e outros teóricos do fascismo? Qual o exato instante em que este hipotético judeu se convenceu que era preciso fugir do holocausto que se aproximava?
Para muitos o aviso nunca veio, ou veio tarde. Muitos não acreditaram que o nazismo chegaria ao poder e depois aos seus excessos. E pagaram por não reconhecer o momento. Demorou algum tempo para que o resto do mundo se desse conta do que estava acontecendo na Alemanha nazista. O fascismo foi visto como um bem-vindo antídoto para a ameaça comunista. Já havia perseguição a judeus e outras minorias no país e a companhia Ford continuava fazendo negócios com a Alemanha — e continuou a fazer negócios depois do começo da guerra. Henry Ford era um notório antissemita, mas os produtores de Hollywood que desencorajavam críticas ao regime de Hitler nos seus filmes para não perder o mercado alemão eram todos judeus. Nenhum reconheceu o momento.
Na falta de um sentinela para nos alertar que os bárbaros estão tomando conta, resta confiar no nosso instinto. Quando chegará o momento que nos convencerá que isto aqui não tem jeito mesmo, e a procurar uma saída? Será que o momento já veio e já foi, e nós não notamos? E sair pra onde? Pra dentro, para a alienação e a burrice induzida, ou para fora, com o euro caro desse jeito?
Veríssimo
O Globo

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