4.04.2016

Empresa Farmacêutica abrirá o direito de patentes para paises pobres

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Empresa também vai ceder patentes de medicamentos de combate ao câncer para iniciativa da ONU. ONG elogia iniciativa, mas pede transparência no processo
Em medida surpreendente e inesperada, a gigante farmacêutica britânica GSK (GlaxoSmithKline) decidiu não entrar mais com pedido de patente de alguns de seus medicamentos em países muito pobres e de baixa renda. Para países com renda média –como o Brasil, Índia e Tailândia-, a cobrança por direitos será mais flexível. As medidas, segundo a empresa, tentam se adaptar à “realidade econômica de cada região.”
A iniciativa abre caminho para que empresas de medicamentos genéricos e similares de regiões menos favorecidas comecem a produzir drogas imediatamente ou sem ter que esperar pelo tempo completo do vencimento dos direitos de propriedade intelectual –o que, espera-se, tenha algum impacto nos preços e no acesso.
A GSK também sinalizou que cederá licenças de medicamentos oncológicos para a Medicines Patent Pool (MPP), uma iniciativa da Organização das Nações Unidas que realiza negociações com empresas para melhorar o acesso a medicamentos para doenças crônicas como a Aids, a hepatite e a tuberculose. A GSK já colaborou com a iniciativa e cedeu, por exemplo, a licença do Trivicay, um antirretroviral de combate à multiplicação do HIV.
Agora, com a cessão de patentes de drogas de combate ao câncer (que o laboratório não especificou quais), a GSK inaugurará rodadas de negociação com medicamentos oncológicos dentro da MPP.
A KEI (Knowledge Ecology International), importante ONG nos debates de mecanismos alternativos para o acesso e distribuição de medicamentos, viu como positiva a iniciativa da GSK. Em nota, a instituição classificou a medida como “impressionante”. A KEI, entretanto, demonstrou preocupação de que todos os processos sejam transparentes e que, em alguns casos, a supressão de restrições vá além dos países pobres e possa cobrir outras circunstâncias (como para pesquisas e exportação).

“Agora, há muitas disparidades no acesso a drogas de combate ao câncer e elas são mais desiguais que o acesso a tratamentos antirretrovirais e de combate à hepatite”, diz a nota da KEI. “A iniciativa da GSK é uma notícia impressionante, mas os detalhes são muito importantes.”

Uma das preocupações da organização versa sobre se alguns países com direito a usar as patentes sem custos vão poder exportar medicamentos. Primeiro, vale lembrar que a GSK toma essa decisão em um momento histórico em que o licenciamento compulsório (em que a empresa se vê obrigada a abrir mão de receber direitos de propriedade intelectual em situação de calamidade e epidemias) já foi uma conquista de países pobres –como foi o caso da produção de medicamentos para a Aids no Brasil.
Só que uma outra conquista nem sempre lembrada dessas regiões foi a possibilidade de exportar esses medicamentos para outras países em necessidade. O Brasil, por exemplo, exportou antirretrovirais genéricos para regiões pobres a preços menores aos praticados pela indústria.

“Sem o direito a importar os medicamentos licenciados, um país sem indústria farmacêutica local não conseguiria fazer uso, na prática, de mecanismos como o licenciamento compulsório e o MPP. Ele precisa comprar essas drogas de países que são capazes de produzi-las, como Brasil e Índia”, diz Miguel Said Vieira, especialista em propriedade intelectual e pesquisador de bens comuns à Saúde!Brasileiros.

“O direito a fazer isso é uma conquista que só foi obtida após muita luta dos países pobres na Organização Mundial de Comércio. É por isso que a menção ao direito à importação na nota da KEI é muito importante”, diz Vieira.


Por que a GSK toma essa decisão?

Em 2015, a GSK alcançou a marca de sexta maior empresa farmacêutica do mundo em medicamentos vendidos. Vale atualmente US$ 90 bilhões. Entre o seu portfólio encontram-se produtos populares como Sensodyne, Eno, Nicorette. A GSK produziu, por exemplo, a amoxilina (antibiótico cuja patente já caiu) e a paraxotina (antidepressivo) -sobre esse último, o laboratório já protagonizou um do maiores escândalos da história.
Além disso, a GSK já escondeu dados de segurança de algumas de suas drogas do FDA (órgão que regula medicamentos nos Estados Unidos). A empresa também pagou uma multa de 3 bilhões de libras por ter comprovadamente subornado médicos para que prescrevessem seus medicamentos (com viagens, e até ingressos para shows da madona, segundo a BBC).
Desde então, a empresa deixou de pagar médicos para que falassem bem de seus produtos (uma prática adotada por muitas indústrias), segundo entrevista concedida por Andrew Witty, CEO da empresa à Science (ele não relacionou a iniciativa ao escândalo, entretanto). A GSK também deixou de pagar comissões a seus vendedores para que parassem de superestimar o valor de seus medicamentos.
Não está exatamente claro o que a empresa espera dessa iniciativa. Segundo o CEO, também à Science, o processo faz parte de uma adaptação a realidades regionais e está dentro de uma tentativa de “mudar a forma como o mercado opera.”

“Não faz sentido manter um modelo de negócio baseado no mindset dos anos 1980. Você precisa ter uma posição que se encaixa nos anos 2020, 2030, e 2040. Não há valor na inovação que não alcança as pessoas que precisam”, disse Witty. 


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